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[NAS TELAS] A Barraca do Beijo

27 agosto 2018

Olá, viajantes!

Hoje eu trago mais uma (pseudo) crítica de filme para vocês, e eu realmente espero que curtam. A Barraca do Beijo é um filme produzido originalmente pela nossa amada salvadora de dias tediosos Netflix e apresenta uma proposta bem clichê e adolescente de enredo, o que, entendam bem, não é ruim, pelo menos pra mim. Se você ainda não assistiu ao filme, vem comigo ver minhas impressões sobre ele, e se você já assistiu (provavelmente!), vamos ver se a gente concorda, beleza?



TÍTULO: A Barraca do Beijo
TÍTULO ORIGINAL: The Kissing Booth
PRODUTORA: Netflix
ANO DE LANÇAMENTO: 2018
TEMPO DE DURAÇÃO: 105 minutos
SINOPSE: Melhores amigos desde sempre, Elle e Lee têm a inventiva ideia de gerenciar uma barraca do beijo durante um evento da escola. Para fazer da proposta um sucesso, a garota tenta convencer o galã Noah, seu crush e irmão mais velho de Lee, a participar da brincadeira. Ele se mostra irredutível, mas os dois acabam se aproximando como nunca, o que estremece a amizade de Elle e Lee.

ATENÇÃO: A RESENHA PODE CONTER SPOILERS DO FILME

Quem nunca suspirou, riu ou chorou (ou fez tudo isso junto) com uma comédia romântica que atire o primeiro lencinho. Acho que é impossível não ter se apaixonado, ao menos uma vez na vida, por um enredo clichê e cheio de estereótipos, mas que, ao final, faz com que a gente se identifique e consiga enxergar uma parte da nossa vida refletida ali. Essa fórmula tem sido explorada com ênfase ao longo dos anos e já rendeu clássicos como 10 Coisas que Odeio em Você ou O Clube dos Cinco. A Barraca do Beijo segue nessa mesma linha e leva o espectador por esse mundo mágico da adolescência e das descobertas, que (na maioria das vezes) são fadadas ao fracasso.

O filme é estrelado por Joey King, Joel Courtney e Jacob Elordi, e inicialmente nos apresenta a Elle e Lee, dois amigos de infância completamente inseparáveis (eles até nasceram no mesmo dia!) e apaixonados por jogos de dança de fliperama. Para que essa amizade realmente funcione e nada passa ser maior do que isso, a dupla cria uma série de regras, que devem ser seguidas à risca, no intuito de proteger e preservar a relação entre os dois (a melhor delas é que diz: sempre que alguém pedir desculpas a você com um sorvete, você deve aceitá-las). Entre estas regras, temos uma em particular que acaba desencadeando todo o enredo do filme: não se envolver (e muito menos se apaixonar) por algum familiar do outro.

Na minha opinião, essa é uma regra criada especificamente para Elle, uma vez que a relação entre Lee e seu irmão Noah (o mais cobiçado do colégio) não é lá essas maravilhas. E tudo ia muito bem, até o fatídico dia da barraca do beijo. Em um evento para angariar fundos do colégio, os dois amigos tem a ideia brilhante de construírem uma barraca do beijo, com os mais populares da escola participando dela. E é nessa barraca, depois de muita armação, confusão e desespero, que Elle beija Noah pela primeira vez. A partir daí, os sentimentos reprimidos da garota pelo irmão mais velho de seu melhor amigo afloram de vez e Noah passa a enxergar Elle com outros olhos. Eles, então, decidem manter o relacionamento entre os dois oculto de Lee, para evitar a briga entre ele e a garota. Só que isso obviamente não vai dar certo e todos nós sabemos disso, não é?

Como vocês podem ver, o enredo do filme é algo relativamente simples: o casal que se curte não pode ficar junto por conta de um milhão de empecilhos e a culpa ronda todos, em algum momento. Dentro dessa premissa temos todos os elementos clichês possíveis: o nerd quietinho, a garota atrapalhada, o bonitão bad boy, as meninas populares (e insuportáveis) que vivem ferrando a vida de todo mundo que não se encaixa no mundinho delas, as confusões, os babados e gritarias típicos de tramas de comédia romântica. E aí vocês me perguntam: isso ainda funciona? E eu respondo: claro que sim!

Por que? Simplesmente porque é impossível ignorar o apelo carismático que essa fórmula traz em si. Todos nós (ou pelo menos a grande maioria) já teve um amor impossível, ou totalmente platônico, um melhor amigo que amávamos, meninas contra as quais precisávamos nos blindar e situações constrangedoras que gostaríamos de esquecer. Eu estou ciente das muitas críticas e de todas as pessoas apontando o dedo para esse estilo de filme por ele não fazer parte daquele gênero considerado o máximo, cheio de enredos complexos, personagens construídas iconicamente e finais mirabolantes. Mas, sério, galera, será que são apenas esses os filmes que a gente deveria assistir? Não sei vocês, mas eu sempre tenho aqueles dias estressantes e cheios, no quais tudo que eu quero ao final do dia é me divertir, me emocionar e suspirar com um filme. E comédia romântica é definitivamente o gênero certo, pelo menos para mim. 

A gente precisa pensar, obviamente, que o sucesso desse estilo cinematográfico não vem do nada. Existe um público, uma demanda e pessoas que consomem esse tipo de longa, por isso ele é tão recriado e construiu uma fama ao longo da história. E não, ninguém é pior que ninguém porque curte assistir esse tipo de filme. Não nos tornemos aquela geração enjoada, que cultua filmes sem nem ao menos entendê-los direito apenas porque a crítica especializada afirma que eles são obras primas incríveis (e não estou dizendo que não sejam, vejam bem). Sou da opinião de que todo mundo precisa de um refresco em algum momento e, dentro dessa proposta, não dá pra negar que A Barraca do Beijo cumpre muito bem o que promete.

Como nem só de elogios vive o bloguinho, eu também admito que o longa, na minha opinião, tem alguns problemas. Vamos falar das personagens, porque é exatamente nelas que residem essas questões nem tão positivas assim. Elle é uma garota adolescente como a maioria de nós um dia foi. Insegura, cheia de dúvidas, descobrindo-se ainda. Além disso, ela é atrapalhada ao extremo, o que garante situações hilárias e super engraçadas, apesar de um pouco forçadas as vezes. O carinho que ela sente pelo Lee é genuíno e pode ser sentido por qualquer espectador e acredito ser por isso que se torna tão angustiante acompanhá-la se esforçando ao máximo para não estragar a amizade dos dois, indo, muitas vezes, contra seus próprios desejos. O mais interessante na Elle está no fato de que o amadurecimento da personagem, em alguns aspectos, como a autoconfiança, a persistência e a vontade de lutar pelo que ela realmente deseja, acontece diante dos olhos do espectador, gradativamente, transformando o enredo em algo muito mais crível e de fácil identificação.

Lee é um amor de pessoa: dócil, fofo e totalmente dedicado à amizade entre ele e Elle. O problema dele reside na reação um tanto quanto difícil que ele mantém com o irmão mais velho, Noah. Noah é tudo que Lee não pode (ou não consegue) ser, e isso gerou um grande complexo no garoto, fazendo nascer um sentimento de que ele precisava proteger tudo ao seu redor das garras do irmão, principalmente o que ele julgava realmente importante em sua vida, que ele realmente amava, o que inclui a Elle. Eu entendo, definitivamente, a frustração que é se sentir inferior em todos os aspectos possíveis, mas não acho que isso justifique o comportamento egoísta e possessivo que Lee tem quando o assunto é a Elle. O mais engraçado é que esse comportamento surge exatamente quando Noah é envolvido na história, o que me leva a crer que ele é a grande incógnita dessa questão. Depois de assistir ao filme, posso dizer que ele realmente é o problema aqui.

Noah é o típico galã adolescente: alto (muuuuuito alto!), bonitão e com pinta de bad boy, o cara faz as meninas suspirarem e os garotos quererem se parecer com ele. A princípio, até eu mesma suspirei por ele, mas tudo muda quando ele começa a realmente mostrar-se e ganhar destaque na trama. Vejam bem, caros viajantes, que eu não estou defendendo o comportamento do Lee com relação a Elle (apesar de eu ter criado uma tendência a gostar muito mais do Lee por motivos de: ele tem a carinha fofa e ponto), mas não posso ignorar a enorme luz vermelha de alerta que Noah representa para mim. Eu me considero, depois de muitas coisas pelas quais já passei, uma mulher feminista e isso, confesso, torna meu olhar um tanto crítica demais, algumas vezes até chato. No entanto, eu não poderia construir essa resenha sem explicar o ponto de vista que eu tenho das atitudes e reações do Noah ao longo do tempo de duração do filme e, acreditem, algumas delas são bem preocupantes.

Para começo de história, Noah só passou a notar Elle de verdade depois de um episódio lamentável (sério, Netflix?) em que ela se vê obrigada a aparecer na escola com uma saia curtíssima, mostrando a todo o quanto seu corpo havia mudado. Fala sério, ser notada apenas depois de uma situação dessas não é algo que entraria na sua lista de coisas incríveis que podem acontecer, certo? Só que Elle, acredito que até um pouco ludibriada por esse novo olhar de Noah sobre ela, não percebe que o garoto é uma fonte pulsante de problemas. Em determinadas cenas do filme, Noah chega a admitir para Elle que os próprios pais já procuraram ajuda para o comportamento agressivo que aflora no garoto constantemente, mas que ninguém nunca conseguiu entender de verdade de onde isso vem. Essa agressividade se mostra explícita em vários momentos ao longo do filme, um deles com maior clareza: após o fatídico acidente da saia, todos os garotos do colégio passam a ver Elle com outros olhos (eu sei, é meio nojento mesmo) e isso simplesmente enfurece Noah, mesmo que a garota não mantenha nenhuma tipo de relacionamento com ele, ainda. O bonitão, então, passa a ameaçar todo e qualquer garoto que demonstre um interesse maior pela menina, prometendo surras e repreensões. É claro que essa é uma tática bastante eficaz para manter todos longe de Elle e abrir caminho para sua aproximação, mas, na minha opinião, é perigosamente preocupante a forma como ele demonstra interesse por ela. Como ele é lindo, alto, popular e tem uma moto, lógico que essa questão é abordada no filme como algo fofo e protetor. Mas não é, gente: é assustador!

E os problemas de Noah não param por aí: ele tem a mania irritante de querer controlar as ações de Elle. Não sei vocês, mas nada me tira mais do sério do que um cara me dizendo o que fazer e quando fazer. Noah teima em acreditar que Elle não é capaz de sair de situações difíceis por conta própria, então ele sempre aparece para "ajudar" a donzela. O problema é quando isso se torna tão profundo, a ponto de decretar as ações da própria menina: em uma cena, Elle entra furiosamente no vestiário dos caras, e Noah praticamente a obriga a sair de lá. O que Elle, em sua infinita inteligência, faz? Tira a blusa e começa a dançar na frente de todos os meninos. E toda essa cena desconcertante, que nos é apresentada como forma de empoderamento por parte da garota, vem acompanhada da narração, na voz de Elle, deixando clara que aquela atitude fazia parte do projeto "você não manda em mim" e, de quebra, incitaria o ciúme do crush bonitão. Ou seja: as atitudes da menina giram em torno de Noah, de algum forma doentia e nada saudável.

Acho que deu para perceber que o Noah não foi meu personagem preferido, certo? Mas eu realmente entendo o argumento de algumas garotas com quem conversei sobre isso, que afirmaram que Noah estava apenas sentindo algo novo e não sabia lidar com aquilo. Posso compreender isso, de verdade. O que não entra na minha cabeça é o longa tentar bancar a visão um tanto quanto complicada de que essas atitudes são positivas e demonstram o tamanho do sentimento de Noah. Acho que aqui a gente entra na questão de repercussão e do quanto essa perspectiva pode, por mais que pareça exagero, disseminar uma abordagem altamente tóxica de um relacionamento abusivo. Sei que essa não é a intenção do filme, longe de mim dizer o contrário, mas as ações do nosso galã configuram abuso e isso não pode passar despercebido.

Vocês lembram ainda da lamentável cena da saia, certo? Vamos voltar a ela mais uma vez, porque é ela que nos mostra, com todas as pistas, que as personagens masculinas dessa história cultivam valores um pouco invertidos: o final da cena mostra Elle sendo assediada por um colega de escola, que simplesmente decide que aquela roupa dava a ele o direito de apertar a bunda dela. Sim, ele fez isso, caros leitores! E isso obviamente fez com que Noah aparecesse com seu escudo protetor, pronto para socar a cara do garoto que atentou contra sua amada (leia-se ironia aqui). Resultado: todos vão parar na sala do diretor, que decide, como autoridade suprema e infalível da escola, dar a Elle a mesma punição de seu agressor, dando a deixa para que ela fosse, nesta situação, vista como também culpada pelo ocorrido. Mas o pior, meus amigos, é que, alguns minutos depois, diante de um pedido de desculpas que não convence nem o meu cãozinho, Elle aceita sair com o mesmo garoto que apertou seu bumbum. Eu sei, claro, que na adolescência fazemos algumas coisas sem pensar e das quais nos envergonhamos mais tarde (eu mesma já fiz várias), mas vocês têm noção do quanto uma atitude dessas é nociva? Aliada à punição que Elle recebeu, ela dá à garota o mesmo patamar de culpabilidade de seu agressor (e sim, vou usar essa palavra de novo porque, para mim, é isso que ele é) e torna-a cúmplice, ou até mais responsável, pelo acontecido. Ela própria se convence disso, tanto que aceita o pedido de desculpas e ainda topa sair com o carinha, como se aquele ato depravado fosse realmente uma demonstração de interesse genuíno por parte dele. Eu fiquei tão revoltada, vocês nem imaginam!

Eu juro que não queria me alongar tanto nessa conversa sobre atitudes controversas, mas acho que é importante dar ênfase também a esse lado das personagens e do próprio filme, por mais que a maioria das pessoas não concorde ou simplesmente não veja sob essa ótica. Por ser um filme destinado ao público adolescente, mais que a qualquer outro, acho indispensável uma visão adequada e saudável da mensagem que o longa passa e das conotações que sua perspectiva sobre os eventos do filme carregam. O final, sem sombra de dúvidas, se supera, ao mostrar uma possibilidade na vida de Elle, que não inclui o Noah (e que pode ser bem mais produtiva, aliás). 

Gosto dos temas que o filme aborda, como amizade, autoconfiança, descoberta de si mesmo, amadurecimento e até a efemeridade das coisas e momentos ao longo dessa fase da vida, tão conturbada e confusa, na maioria das vezes. E acho que a grande sacada do longa vem exatamente daí, da realidade que traz intrínseco a si, da identificação que proporciona. Depois de alguns surtos de nervo, mas, confesso, muito mais de risos, acho que A Barraca do Beijo cumpre o que propõe o gênero comédia romântica: um enredo despretensioso, recheado de situações hilariantes, que entretêm e prende até o final. O desfecho ainda quebra os padrões e mostra algo que, pelo menos eu, não esperava. A Barraca do Beijo é exatamente um daqueles filmes que a gente vai amar ver e rever em um fim de semana chuvoso, acompanhada de chocolate quente e cobertor, mas eu não posso deixar as ressalvas passarem batidas. Vou deixar abaixo o trailer do filme, para vocês, viajantes que ainda não assistiram ao filme.




E vocês, já assistiram ao filme? Qual sua opinião sobre o Noah? Vamos conversar! Até a próxima postagem, viajantes!

[RESENHA] Entre Quatro Paredes - B. A. Paris

09 agosto 2018


Olá, viajantes!
A resenha de hoje traz para vocês um livro que há algum tempo andava parado aqui na estante, mas que eu sentia muita curiosidade em ler. E posso dizer que a experiência de leitura superou as minhas expectativas, de forma quase dolorosa. Vocês vão entender porque ao longo das minhas impressões. Agora, sem mais delongas, vamos falar de Entre Quatro Paredes, de B. A. Paris!

Entre Quatro Paredes
TÍTULO: Entre Quatro Paredes
AUTOR: B. A. Paris
EDITORA: Record
NÚMERO DE PÁGINAS: 266 páginas
SINOPSE: Grace é a esposa perfeita. Ela abriu mão do emprego para se dedicar ao marido e à casa. Agora prepara jantares maravilhosos, cuida do jardim, costura e pinta quadros fantásticos. Grace mal tem tempo de sentir falta de sua antiga vida. Ela é casada com Jack, o marido perfeito. Ele é um advogado especializado em casos de mulheres vítimas de violência e nunca perdeu uma ação no tribunal. Rico, charmoso e bonito, todos se perguntavam por que havia demorado tanto a se casar. Os dois formam um casal perfeito. Eles estão sempre juntos. Grace não comparece a um almoço sem que Jack a acompanhe. Também não tem celular, que ela diz ser uma perda de tempo. E seu e-mail é compartilhado com Jack, afinal, os dois não guardam segredos um do outro. Parece ser o casamento perfeito. Mas por que Grace não abre a porta quando a campainha toca e não atende o telefone de casa? E por que há grades na janela do seu quarto? Às vezes o casamento perfeito é a mentira perfeita.


     

*ATENÇÃO: A RESENHA PODE CONTER SPOILER DO LIVRO

Grace é uma garota como qualquer outra, com várias responsabilidades, no entanto. Sua irmã Millie tem síndrome de Down e ela sabe que, assim que seus pais resolverem aposentarem-se de vez e sua irmãzinha sair do colégio interno onde vive, a tarefa de cuidar da pequena ficará em suas mãos, o que não é nenhum sacrifício, já que as duas se amam e se dão muito bem. Porém, com todo seu tempo dedicado ao emprego que lhe exigia viagens frequentes por diversas partes do mundo, Grace preocupava-se em não poder dar a Millie todo o amor e atenção que merecia e por isso se jogou de cabeça na oportunidade que surgiu em sua vida a partir do momento que conheceu Jack, um advogado de renome, conhecido por ajudar mulheres vítimas de violência por parte de seus maridos.

Jack surgiu como um fôlego novo na vida de Grace e ela se apaixonou perdidamente por ele rapidamente. Por esse motivo, ninguém se surpreendeu quando os pombinhos anunciaram seu casamento. Agora Grace não iria precisar trabalhar, podendo dedicar-se exclusivamente a sua nova casa, à Millie e ao marido que ela tanto amava. Além disso, ao fazer 18 anos sua irmã teria um lar e uma família esperando por ela, uma vez que Jack generosamente ia trazê-la para morar com os dois. Um futuro que parecia infinitamente promissor e feliz transformou-se, entretanto, em algo negro e obscuro, a partir de uma revelação que Grace jamais poderia imaginar ou supor. O que você faria de descobrisse que o homem pelo qual se apaixonou e com o qual sonhou construir uma vida não é nada daquilo que você havia imaginado?

Entre Quatro Paredes foi indicação de uma amiga num clube de leituras do qual participei algum tempo atrás e, pela sinopse, eu me interessei pelo livro. Comprei meu exemplar mas infelizmente ele foi parar na enorme pilhas de títulos para ler assim que a oportunidade surgisse. Quando eu enfim comecei a leitura, não imaginava a quantidade imensa de emoções que ele faria surgir e isso me pegou desprevenida, mas não foi algo ruim, no sentido prático da palavra: pelo contrário, eu me vi totalmente envolvida com a história de Grace e Jack, torcendo para um final feliz que dificilmente viria.

A narrativa é organizada de forma a alternar capítulos entre passado e presente e o foco narrativo aqui é totalmente voltado para Grace, sendo, portanto, em primeira pessoa. Acredito que essa escolha não poderia ser mais acertada no caso específico desse título. O leitor acompanha todas as cenas através da visão da protagonista, e por isso consegue acompanhar de um jeito quase íntimo todos os sentimentos, as emoções e as sensações que vão surgindo com o desenrolar da trama. Essa visão tão detalhista da própria história faz de Grace uma narradora exemplar e dá ao leitor a possibilidade de entender e, mais do que isso, sentir, exatamente o que a personagem passa durante cada situação e, na minha opinião, é essa perspectiva em primeira pessoa que dá o tom definitivo de intensidade e dramaticidade que o livro carrega.

O livro inicia com a cena de um jantar entre o casal protagonista e seus amigos mais próximos. Ali somo apresentados ao relacionamento perfeito de Jack e Grace e conhecemos o início de sua história. A sensação de desconforto, que vai se estender ao longo de toda a narrativa, começa já nesta parte inicial da trama, na qual o leitor consegue perceber pistas (pequenas, mas contundentes) de que talvez a relação entre Jack e Grace não seja assim tão consistente e irrepreensível como eles querem fazer parecer. Espero não dar um spoiler gigante, mas não há maneira de continuar essa resenha sem mencionar esse detalhe tão importante na história: esse é um livro que trata de abuso. E não, eu não estou falando de todos os casos que Jack bravamente defende como advogado, das mulheres que salva ou dos covardes que manda para a cadeia. Estou falando, sim, da relação entre ele e sua tão amada esposa.

Acho que aqui vale destacar, caso você, caro viajante, ainda não tenha se dado conta disso, que a violência não se dá apenas em um nível físico. Muito além das dores que qualquer machucado pode causar, um dos piores lados de relacionamentos abusivos se mostra psicológico, a partir de palavras, ameaças e restrições que afetam diretamente a vida do parceiro. É exatamente esse abuso psicológico que tanto incomoda ao longo deste livro em específico, e mais do incomoda inquieta: é como se o leitor pudesse entrar na história e sentisse todos os medos, angústias e aflições de Grace a partir do momento que seu marido se revela um perfeito psicopata. E, diferente do que muitos de vocês podem estar imaginando, isso não acontece logo de cara, apesar de ser rápida a percepção para quem está de fora da situação. Pequenas atitudes, caprichos que não fazem sentido (como Grace deixar de lado seu emprego), um controle que parece possessivo, são essas as pistas principais que Jack deixa em seus discursos, em seus gestos, em qualquer coisa que faça relacionada à Grace. E uma das piores consequências dessa dominação exercida por ele, na minha opinião, é o fato de fazê-la pensar que todo esse cerco, essa bolha que ele criou em volta da esposa, vai fazer bem a ela de alguma forma.

É no mínimo triste ver a mudança que ocorre em Grace, interna e externamente, a partir do momento que Jack entra em sua vida. De uma mulher decidida, segura de si e bem-sucedida profissional e pessoalmente, a nossa protagonista se transforma em um ser apático, submisso e obediente, incapaz de pensar ou agir por conta própria. Grace se anula completamente dentro desse relacionamento, no início por amor, mais tarde por medo. Medo não apenas por si mesma, mas pela irmãzinha, que viria a ser mais uma vítima nas mãos de Jack. Revolta, choca e faz doer toda a situação com a qual Grace se vê envolvida. Jack, que no início mostrou-se o parceiro ideal, torna-se frio, cruel e sádico ao longo da narrativa, e também é doloroso acompanhar esse desenvolvimento.

Em várias passagens do livro me senti acuada, indefesa e frágil, junto com Grace. Em vários momentos consegui me envolver tanto com a narração de Grace, me sentir tão tocada por ela, que as lágrimas vieram quase naturalmente. Em vários trechos do livro precisei parar a leitura, controlar a respiração e pensar duas vezes antes de voltar às páginas, sempre nutrindo a esperança vã (que é também o que move Grace) de que tudo ficará bem no fim. É difícil, para não dizer impossível, não entrar dentro da trama, não se comover com a situação da protagonista, não ser empático e sensível à dor quase palpável que a destruição de todos os sonhos que Grace tanto acalentou causa dentro dela mesma. Talvez sejam esses mesmos sonhos que dão forças a ela para aguentar o que lhe é infligido, talvez seja o amor que nutre por sua irmã, talvez seja a última chama ainda acesa de que tudo aquilo não passe de um pesadelo. Na verdade, não importa. O que importa aqui é que, com uma narrativa delicada e ao mesmo tempo forte, somos levados a sentir o soco no estômago que é Entre Quatro Paredes. A autora consegue transmitir, através de sua narradora, uma situação tão real, tão concreta, que amedronta, afugenta e faz sofrer, ao mesmo tempo em que chama o leitor à realidade, coloca sobre ele a responsabilidade de não apenas acompanhar essa história, mas também pensar em qualquer atitude que possa ser tomada para remediar (se é que isso é possível) a dor e a tristeza causadas por esses abusos.

Eu entendo, também, que talvez exista em Jack algum tipo de anomalia que o torna tão cruel e o leva a tomar determinadas atitudes. Em diversas passagens da narrativa o protagonista menciona uma necessidade funesta pela violência, por se alimentar, de alguma maneira, da dor do outro. Quem sabe essa seja a verdadeira face desses abusos, o verdadeiro fator que o leva a cometer tantas atrocidades. Porém, em outras diversas passagens o leitor acompanha o sofrimento que essa situação causa em Grace, e a satisfação tremenda e incontestável que essa dor provoca em Jack. É difícil, para não dizer impossível, ficar alheio e se manter racional frente a todas as provações pelas quais a personagem principal passa. É difícil não torcer por ela, e odiar Jack, de forma avassaladora e irreversível. É difícil não querer estender a mão, abraçá-la e arrastá-la da casa que ela um dia sonhou chamar de lar. E é esse o sentimento que nos acompanha até o final da narrativa, junto a tantas outras emoções incômodas, dolorosas e fortes, que nos tiram da zona de conforto e nos desmascaram uma realidade nada bonita, mas extremamente verídica.

Mas essa resenha não é apenas feita de dor e sofrimento. Em meio a esse turbilhão de emoções, também encontramos um alívio, um sopro de brisa fresca e doce, que se chama Millie. A irmãzinha de Grace é sem dúvidas uma das melhores personagens que eu já pude conhecer nessa longa vida literária. Apesar de ninguém além de Grace acreditar realmente na capacidade da menina, sua inteligência e perspicácia vão além dos limites impostos a ela pela opinião alheia. Divertida, alegre e sempre grata aos pequenos presentes que a vida lhe reserva, Millie é um exemplo para todos nós. O amor e a admiração que ela nutre por Grace são tão fortes que ela quer protegê-la de todo e qualquer sofrimento. É impressionante a forma como a garotinha realmente sente quando algo está errado, quando Grace não se mostra bem e feliz. E é mais impressionante ainda a disposição que Millie demonstra para mudar essa situação e reverter o que tanto incomoda sua irmã. Meiga, esperta e encantadora, essas são as reais características que tornam impossível não se apaixonar pela garota.

O final da narrativa foi um dos pontos menos positivos para mim no livro. Apesar de eu respirar aliviada com ele, na minha opinião ele aconteceu de forma muito rápida, sem o aprofundamento necessário. Gostei da forma como a narrativa foi construída, de modo a entregar aos poucos para o leitor os elementos desse desfecho, e realmente não existiram pontas soltas. Minha ressalva está mais ligada ao fato de ele parecer muito corrido, como se a autora estivesse com pressa para fechar a narrativa. Independente disso, Entre Quatro Paredes não é apenas uma ótima recomendação, mas também um livro necessário, em qualquer época ou lugar. A obra criada por B. A. Paris nos faz refletir não apenas sobre um tema que bate a nossa porta em vários momentos ao longo da vida, mas também sobre nós mesmos e nossas atitudes (ou a falta delas) frente a situações como essa. Talvez por isso seja tão duro e doloroso terminar essa narrativa, ao mesmo tempo em que é preciso terminá-la. Mais do que isso: é preciso compreender que ela não se encerra na última página lida. Há muitas Graces esperando ajuda por aí, muitos Jacks espalhando terror e medo, e nós, como seres humanos, temos o dever de ficar atentos a esse tipo de situação e fazer o que for possível para ajudar.

E vocês, já leram o livro? O que acharam? Me contem nos comentários, combinado? E perdoem a resenha gigante de alguém que realmente se sentiu extremamente tocada por esse livro (rs). Até a próxima postagem!

[PRIMEIRAS IMPRESSÕES] Silhuetas na Penumbra - Rafael Sales

03 agosto 2018


Olá, viajantes dos livros! Prontos pra mais uma primeira impressão?
Silhuetas na Penumbra – Semente de Âmbar é um livro de fantasia nacional, novo lançamento da editora Pendragon. A editora mantém uma parceria bem legal com alguns blogs e disponibiliza para eles o primeiro capítulo dos seus novos títulos, para a realização das primeiras impressões. Nós aqui do Livros Viajantes fazemos parte desse projeto e são os comentários sobre o livro de Rafael Sales que eu venho trazer hoje a vocês, nossos viajantes.

TÍTULO: Silhuetas na Penumbra - Semente de Âmbar
AUTOR: Rafael Sales
EDITORA: Pendragon
ANO DE LANÇAMENTO: 2018
COMPRAR
SINOPSE:
Há milênios a humanidade é usada como peça de uma guerra oculta. De um lado, forças angelicais lutam para defender a Criação, enquanto legiões demoníacas arquitetam planos para reinar sobre a dimensão dos mortais. Entre as duas forças, as entidades de Fantás’ya tentam preservar o equilíbrio, mas o empate entre Ordem e Caos reviveu uma promessa já esquecida. Após anos em um orfanato, Elisa é adotada por uma renomada artista plástica e vê sua vida mudar ao chegar em uma cidade repleta de mistérios e mansões. A estreia do espetáculo circense desencadeia acontecimentos que levam a garota descobrir que existem verdades escondidas em seus pesadelos corriqueiros. O destino de inúmeras vidas estará em uma única escolha. Série premiada na categoria “Contadores de Histórias” do Wattys 2017.
Silhuetas na Penumbra nos apresenta a Elisa, uma garota órfã, que passou a maior parte da infância em um orfanato, até ser adotada por uma artista plástica muito famosa, Nuelly Adágio. Desde que isso aconteceu, a vida de Elisa foi agitada: devido às exposições e ao próprio trabalho de sua nova “mãe”, as duas viajavam muito, não ficando muito tempo em apenas um lugar. Por isso a garota não estava animada para construir amizades ao chegar na nova cidade. Menos empolgada ainda estava com o fato de ser novamente a caloura na escola. Elisa tem tudo para ser mais uma adolescente normal e cheia de dúvidas, se não fossem por seus pesadelos frequentes e assustadores, que parecem ficar cada vez mais reais. Confusa com sua nova vida e atormentada por essas visões amedrontadoras, a jovem tenta seguir normalmente sua rotina. Qual não é sua surpresa ao se deparar com duas figuras destoantes logo em seu primeiro dia de aula, duas figuras que ela já conhecia de seus pesadelos e que a deixaram já em estado de alerta. Assustada, Elisa não consegue parar de se perguntar como isso é realmente possível, ao mesmo tempo em que tenta se convencer, em vão, de que tudo isso não passa de uma mera ilusão de sua mente já perturbada.

Uma das coisas que eu mais curto em primeiras impressões é que elas te dão uma dimensão bastante coesa da história que está por vir, apesar das poucas páginas que compõem a degustação. Em Silhuetas na Penumbra, isso acontece de uma forma ainda mais arrebatadora: logo nas primeiras cenas, somos transportados aos sonhos de Elisa, com toda a sua velocidade, intensidade e assustadora realidade. Essa pequena cena que descreve esse pesadelo da protagonista dá o tom (eu espero) para o restante do livro: nebuloso, misterioso e inevitavelmente arrebatador.

A história é contada em terceira pessoa e, dessa maneira, temos uma dimensão maior e mais privilegiada dos sentimentos e ações das personagens. Além de Elisa, nos são introduzidos seus novos amigos (Laura, Camy, Aleksandra, Jeane e Martin), Sueli e Carlos, os funcionários da mansão de Nuelly Adágio, e mais alguns nomes que, ao meu ver, terão grande destaque no decorrer do livro. Entre eles destaco Dominus, um rapaz lindo e cheio de mistério que se aproxima de Elisa, causando arrepios instantâneos na garota, além de um tremendo desconforto; Joshua e Stark, as duas figuras tão parecidas com os homens dos pesadelos da protagonista, que, junto a Killa, formam um trio não apenas diferente de todos naquela escola, mas também enigmático e intimidador; e Diana, que pra mim foi uma das personagens mais difíceis de compreender ao longo desse fragmento da obra, visto que aparece em apenas uma pequena parte dele. Apesar disso, pode-se entender facilmente que Diana é uma das participantes desse outro mundo que habita em paralelo com aquele que conhecemos, um mundo permeado por fantasia, imaginação, seres místicos e poderosos e uma disputa que ameaça o futuro de todos.

Todas as personagens foram apenas introduzidas neste trecho selecionado da obra, portanto acredito que elas ainda tenham muito a crescer e se desenvolver ao longo da narrativa. Algo que fica claro, desde o início, é que todas elas serão construídas de forma bastante sólida e concreta, tendo papel fundamental para o desfecho da trama. Independente de eu já elencar algumas delas como figuras secundárias no enredo, acho que todas contribuirão de forma significativa em algum ponto, cumprindo funções e papeis de suma importância durante o desenrolar da história.

Por ser um livro de fantasia, que mistura tantos seres já conhecidos e amados por nós leitores, Silhuetas na Penumbra inicia com grandes vantagens. Depois dessas primeiras páginas, é possível perceber com clareza a dimensão gigantesca que o autor pretende dar ao seu enredo e a quantidade enorme de fatos, espaços, cenários e implicações que essa trama vai gerar. O universo ainda tem muito para ser explorado e eu confesso que, como amante desse gênero, fiquei bastante curiosa para desvendar todos os segredos que o livro ainda guarda.

Algo que eu não poderia deixar de mencionar nestas primeiras impressões, e que já fica claro logo pela capa, é a qualidade do trabalho da editora. A diagramação interna do livro, cheia de arabescos que remetem à história e ao mundo criado pelo autor, a capa detalhada e tão minuciosamente pensada, a revisão satisfatória do texto até chegar ao leitor, tudo isso demonstra carinho, cuidado e atenção não apenas com o público que vai consumir o livro, mas também com o próprio autor e com o livro que chega até nossas mãos. Demonstra que ele foi pensado e organizado com o maior amor do mundo e isso dá ainda mais vontade de mergulhar de cabeça na leitura.

Se vocês ficaram interessados e querem adquirir também o seu exemplar de Silhuetas na Penumbra, saibam que ele já está à venda no site da editora e para acessar o link de compra diretamente é só clicar aqui ou no na palavra COMPRAR escrita bem gigantescamente pra vocês lá perto das informações como título e sinopse. Depois de lerem não esqueçam de vir me contar o que acharam, combinado? Até a próxima postagem, viajantes!